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sábado, 4 de dezembro de 2010

Caça e Caçador

Os cubos de gelo batem em meu copo. O uísque, gelado, amargo. Nem sei porque tomo essa droga! As pessoas conversam em grupos, circulam em duplas. O sofá macio em que me afundo e a música jogando vibrações em meus ouvidos. A gostosa sensação de abandono. O se sentar de qualquer jeito, sem mesuras ou estudos. Apenas confortável. O copo queima meus dedos. Um acorde mais agudo chama minha atenção e começo a voar nas pautas etéreas. Um trago e a fumaça sobe marejando meus olhos. Um trago e a bebida desce rasgando minha garganta. Sinto um arrepio leve, quente, gostoso. Desço das pautas no ar e ergo os olhos no horizonte e, por trás do cristal de um copo, dois olhos negros me fitam. A fumaça entra em meus olhos desavisados e pisco limpando a vista. Sumiu. Terei sonhado? Já não me sinto tão confortável. Reprovação? Incômodo? Caça? Mexo-me em meu trono procurando uma posição mais discreta. Quero passar despercebida. Não quero viver a festa, só observá-la. Arrepio. Bebo a água com uísque, agora menos amargo. Uma nuvem de Stiletto passa por mim numa sombra negra de riscado e blusa branca. Não já terei visto esses olhos? A fumaça do cigarro deixa passar apenas sua silhueta. Aquele acorde agudo desta vez me assusta e o arrepio volta mais quente, queimando. Pessoas dançam no salão, se enlaçam e rodopiam num ritmo não muito lento. No meio de tanta gente, meus olhos se perdem e desviam, passando apertado entre um corpo e outro e mais outro até esbarrarem em dois olhos negros encostados à janela. Lentamente apago o cigarro para que a fumaça não o leve de novo. O arrepio cresce em tremor e posso sentir seu perfume como se não houvesse perfumes, quitutes e cigarros, apenas nós. Sinto a quentura nas faces e olho o copo para esconder o rubor que, sei, está em meu rosto. A pele arrepiada se torna sensível a qualquer vibração. E essa sensibilidade, como um radar, me diz que ele se aproxima. Sinto-o à minha frente. O perfume me envolve. Ergo os olhos e já não há mais festa, nem sons, nem pessoas. Só caça e caçador.

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